Jorge Castro
Senhora Ministra das Más Ocorrências
Senhora Ministra das Más Ocorrências
humilde eu cá venho a V. Exª.
não trago o burel
o cordel sequer
porque a um e a outro pu-los de aluguer
mas por vir tão nu não cuide vossência
que se trata aqui de alguma indecência
o facto é que eu
Senhora Ministra
à falta de pão já como alpista
que sobra na loja que há no meu bairro
picando no chão inóspito e frio
sinto até receio de perder a fala
de perder a alma
de perder o pão
pois por tanta taxa que pago a vossência
foram-se os anéis
já ali vão os dedos
deslizo confuso perto da indigência
(deslizo é verdade
mas deslizo liso)
pago para o Iva
pago para os esgotos
pagarei a autárquica
paguei o IA
dei tudo o que tinha
e mais já não há
e taxa após taxa que ainda lá vem
na bruta labuta de quem mais não tem
já rasguei o bolso catando vintém
paguei o imposto de circulação
e ainda me falta em grande aflição
um que é uma graça que até soa bem
que vem junto à luz que cobra demora
o tal da sonora radiodifusão
pareço um burrico á roda da nora
Num paga que paga em tal profusão
que até já pensei
oh triste de mim
fugir prá Lua com os pés de fora!
vem na gasolina
está nas portagens
por isso é que eu já nem faço viagens
e quando parece que nos acontece alguma acalmia
vem-nos uma azia que nos arrefece
que nos estremece pois é já Fevereiro
que nos traz lampeiro o IRS
não sei que mais faça
o que mais me obriga
se olhos não tenho
que faço à barriga?
talvez a converta pra me render juros
talvez assim possa pagar os seguros
juros que não passam de meros patacos
e que são finos delgados e leves
que mais me parecem pêlos de sovacos
Senhora Ministra
com tão fundo zelo
neste meu desvelo pr'à fazer feliz
eu fiquei sem cheta pr'ó imposto de Selo
então o que é que eu faço?
quem é que me diz?
é que
vamos lá
sejamos cordatos
ninguém pode dar quando já não há
e se o pé descalço esperou sapatos
ficará danado se ninguém lhos dá
a própria madre Teresa de Calcutá
houve um tempo que deu
agora não dá
por isso
humilde
pobre e obnegado
eu vinha pedir a V. Exª,
Senhora Ministra das Más Ocorrências
já sem o burel
o cordel sequer
uma coisa simples honesta singela
que me sugeriu este triste fado
por já não ter fundo a minha panela
lá comi o cinto
ficou-me a fivela
assim o que eu peço a V. Exª,
é a clemência
essa coisa nobre
essa coisa bela
por paus e por pedras e benevolências
porque não se movem invejas nem cunhas
mas porque a ansiedade me deixou sem unhas
em vez de cobrar impostos a trote
vergaste-me só com bravo chicote
trocando-me as taxas as multas
impostos
por lágrimas
sangue...e por penitências!
tal eu deixaria
grato e indigente
à consideração de V. Excelência...
in Contra a Corrente, Poemas que eu digo
Senhora Ministra das Más Ocorrências
humilde eu cá venho a V. Exª.
não trago o burel
o cordel sequer
porque a um e a outro pu-los de aluguer
mas por vir tão nu não cuide vossência
que se trata aqui de alguma indecência
o facto é que eu
Senhora Ministra
à falta de pão já como alpista
que sobra na loja que há no meu bairro
picando no chão inóspito e frio
sinto até receio de perder a fala
de perder a alma
de perder o pão
pois por tanta taxa que pago a vossência
foram-se os anéis
já ali vão os dedos
deslizo confuso perto da indigência
(deslizo é verdade
mas deslizo liso)
pago para o Iva
pago para os esgotos
pagarei a autárquica
paguei o IA
dei tudo o que tinha
e mais já não há
e taxa após taxa que ainda lá vem
na bruta labuta de quem mais não tem
já rasguei o bolso catando vintém
paguei o imposto de circulação
e ainda me falta em grande aflição
um que é uma graça que até soa bem
que vem junto à luz que cobra demora
o tal da sonora radiodifusão
pareço um burrico á roda da nora
Num paga que paga em tal profusão
que até já pensei
oh triste de mim
fugir prá Lua com os pés de fora!
vem na gasolina
está nas portagens
por isso é que eu já nem faço viagens
e quando parece que nos acontece alguma acalmia
vem-nos uma azia que nos arrefece
que nos estremece pois é já Fevereiro
que nos traz lampeiro o IRS
não sei que mais faça
o que mais me obriga
se olhos não tenho
que faço à barriga?
talvez a converta pra me render juros
talvez assim possa pagar os seguros
juros que não passam de meros patacos
e que são finos delgados e leves
que mais me parecem pêlos de sovacos
Senhora Ministra
com tão fundo zelo
neste meu desvelo pr'à fazer feliz
eu fiquei sem cheta pr'ó imposto de Selo
então o que é que eu faço?
quem é que me diz?
é que
vamos lá
sejamos cordatos
ninguém pode dar quando já não há
e se o pé descalço esperou sapatos
ficará danado se ninguém lhos dá
a própria madre Teresa de Calcutá
houve um tempo que deu
agora não dá
por isso
humilde
pobre e obnegado
eu vinha pedir a V. Exª,
Senhora Ministra das Más Ocorrências
já sem o burel
o cordel sequer
uma coisa simples honesta singela
que me sugeriu este triste fado
por já não ter fundo a minha panela
lá comi o cinto
ficou-me a fivela
assim o que eu peço a V. Exª,
é a clemência
essa coisa nobre
essa coisa bela
por paus e por pedras e benevolências
porque não se movem invejas nem cunhas
mas porque a ansiedade me deixou sem unhas
em vez de cobrar impostos a trote
vergaste-me só com bravo chicote
trocando-me as taxas as multas
impostos
por lágrimas
sangue...e por penitências!
tal eu deixaria
grato e indigente
à consideração de V. Excelência...
in Contra a Corrente, Poemas que eu digo
Comentários
é autêntica,
malvada e cínica.
Fala todos os idiomas,
não descrimina nenhuma
etnia e atravessa as eras
porque se alimenta na
insanidade perpétua
da natureza humana...
bj