Natália Correia









Necessário é satisfazer o ofício das trevas


I
Uma dor fina que o peito me atravessa,
A escuridão que envolve o pensamento,
Um não ter para onde ir cheio de pressa,
Um correr para o nada em passo lento,

Um angustiante urgir que não começa
Um vazio a bolar no alheamento,
Uma trôpega ideia que tropeça
No vácuo de um estranho abatimento.

É tédio? É depressão? Talvez loucura?
É, para um além de mim, passagem escura?
Um ir por ir que não tem outro lado?

É, sem máscaras, a esperança enfim deposta,
Ou no extremo da verdade exposta
A ironia feroz de um deus calado?


in Poesia e sonetos românticos, edit. Frente e Verso
fotografia de Joerg Colberg



Poetisa e dramaturga, ativista política e defensora dos direitos das mulheres, Natália Correia foi tudo isso e muito mais. Nascida em 1923 na ilha de São Miguel, a sua figura marcaria a cultura e a sociedade portuguesas da segunda metade do século XX, dona de uma personalidade carismática e combativa, sem medo de assumir posições que tantas vezes abalaram preconceitos enraizados e desafiaram as convenções, nomeadamente nos anos em foi deputada na Assembleia da República. Na RTP teve uma presença importante sobretudo durante a década de 80 enquanto autora da série “Mátria”, uma visão do lado matriarcal da sociedade portuguesa. Faleceu em 1993, na sua Lisboa adotiva, aos 69 anos de idade

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