Desconseguiram Angola
Um romance ficcional, soberbo, que poderia bem ser, um retrato fiel, da riqueza que prolifera num país "desconseguido", onde o passado se mistura com a antiguidade e o futuro com as guerras divinas dos deuses. Mujimbos e kambas, Kota Venâncio, Silvino, Zebidal, Zefa e Zico, protagonistas destes retratos, quer de guerra, quer da cultura que foi se "conseguindo" muito graças aos dons artísticos, dialéticos e expressivos de um povo mutante, flexível e plenamente aberto à reconstrução de si mesmo. E chegar a nós nesta obra, graças ao dom do próprio autor. Não esperava encontrar esta apresentação no youtube, fiquei agradavelmente surpreendida.
Também não esperava ver o humor misturar-se ao surrealismo e à vertigem real da Angola do antes e do depois dos retratos de guerra, que, também eu, conheci por dentro, no pós-colonialismo. Um grande bem-haja ao autor, António Costa Silva, que, mais do que escrever e dissertar sobre as idiossincrasias de um país assoberbado por outros, esculpiu e lapidou (quase) toda a beleza que cruza o povo e as suas condicionantes. Quando digo quase é porque sobrevoou, somente, a bela gastronomia do país onde não se pode esquecer a música, a poesia, o funje, o mofete, mas menos ainda o feijão de óleo de palma.
Hoje terminei a leitura, junto da Santa Francesinha, em plena praça dos Poveiros, a chamada praça das esplanadas da alimentação no Porto e fui, novamente, surpreendida e servida por um angolano culto e curioso, atento e mui educado (professor de inglês em Angola) que me perguntou onde poderia adquirir este livro para ler. Na verdade, podem adquiri-lo em qualquer ponto de venda onde o bom gosto ande a par com as novidades de leitura, eu encontrei-o em Leça, mas este exemplar é para ser emprestado a este cavalheiro que merece matar saudades neste livro, num mergulho profundo e hedonista nesta Angola que me cuia bué.
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