O meu 11 de Setembro foi sempre a 10
Faz hoje trinta e nove anos que um anjo partiu.
Antes houve um pré-aviso de que o mundo, o meu, se ia continuar a desmoronar.
O avô Francisco, cinco meses antes, a 23 de Julho, partia, data do aniversário do tio Domingos. No dia 21, tinha feito eu aniversário e o avô Rodrigo chamou por mim ao hospital. Não me lembro porque não fui ou não fui a tempo de o ver acordado.
Depois disso, lembro-me de o chorar na capela de Ermesinde e a minha madrinha, irmã dele, que só a via de quando em vez, virou-se para mim, depois de se ter despedido do seu irmão e disse-me: Alzira, estás tão sorumbática! Limpa essa cara, peito pra cima! - e foi-se! Só a voltei a ver anos depois, quando me mudei para a Rua Costa Cabral, nos CTT, bem pertinho da Fábrica que os pais deles tinham de calçado. Ao lado da confeitaria Universo.
Nos Sonhos, a 13 ou 14 deste mês, já não me lembro, porque ele foi autopsiado, o meu irmão, sei apenas que chovia como chove hoje, copiosamente, o céu estremecia e nem isso afastava a gente adulta e os miúdos que foram despedir-se do meu irmão, então com onze anos.
O que para uns é o 11 de Setembro na América e no mundo, para mim foi antes, a dez, sempre a dez, a dez de abril de mil novecentos e setenta e cinco e, dez anos mais tarde, o avô antes, e o Rui Alberto depois, a dez também, neste mesmo dia, há trinta e nove anos. Um dia que foi uma noite, um dia que a vida mais uma vez nos deu um açoite, que procurei na sua almofada, dia após dia e noite após noite, até o choque passar, o ritmo acelerado e compassado do coração do meu irmão que se sumiu, que Deus não esperou para o vermos crescer, que fiquei órfã outra vez, depois do pai e do avô, partiu mais um anjo que a eternidade não soube esperar por mais tarde, e é sempre cedo que partem os anjos, os amigos, e de onde ele está eu lhe mando um beijo molhado, uma saudade que ainda se lembra dele intacto!
-Pai, nunca esquecemos nem a tua data nem a do avô Rodrigo, mas a do Rui é impossível de esquecer!
Ah pai, se me tivesses levado a mim, talvez esta família estivesse mais inteira!
Que os que partem só ficam em nós, escavando uma dor profunda, uma dor imunda, como são todas as dores! Estas partidas só favorecem quem vai, porque quem fica, deve (de dever) aprender a viver com a dor, mas não esquece, a saudade fica, prevalece e nunca é dia neste dia, é sempre noite escura e profunda! Perder é aprender a dar valor aos que aqui estão e o resto é só vontade de partir para onde foram todos os que nos disseram adeus, sem boca, sem despedida, sem autorização, sem aviso, sem direito!
Prezem os que ainda em vida têm. Um dia partem eles também, mesmo quando sois vós a partir!
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