Al Qabri Ramos & Peter Gabriel & José Cid
O rei vai triste e nu
Tal como as comunidades
e as raízes delas, o casamento
com a coroa durará 3 dias, lavados
a fio de ouro de trinta quilates
e mais do que dez debates
sobre quem deve e não ir
ao seu linchamento coloquial
o rei levará o cetro junto ao coração
que um monarca tem que merecer a coroa
e possuir coração
ele vai triste
não por ser rei
mas por ser tarde, e os seus plebeus
já não gostarem
nem dos costumes monarcas
nem de toda a baboseira
que sai de lá
O rei vai como um réu
cumprir funções de estado,
gastar muito e ser absorvido
por todos os jogos de bridge
ainda não gozados,
o rei é hoje um monarca pobre
que presta contas ao primeiro-ministro
da conta do papel higiénico
do tabaco de enrolar e dos eventos
que vão emagrecer o tecido social
Pobre monarquia triste
que teima em mostrar com pompa
o que o traje e a lábia ronca
Não há alegria na monarquia inglesa
e nem beleza noutra qualquer
Porque os reis do nada
mostraram aos seus plebeus
que não acrescentavam valor à sua simbologia
mas acrescentavam impostos à sua estadia
frequente
em resorts europeus,
em paraísos fiscais
em ritos e rituais que não merecem lugar
No tempo de monarquia
quem veste as vestes imperais são os plebeus
pois eles é que pagam os seus belos uniformes
bordados a safira
O rei, é lícito,
pode ir triste e ricamente
vestido,
ostensivamente programado
pode ver a sua herança em riste
fugir-lhe para pagar o teto do NHS
mas não,
antes vir na televisão
nas cerimónias previstas
Que o rei no seu esplendor
nada tem para oferecer à nação
A não ser, talvez,
os seus gastos sem vergonha
a sua triste alegria e peçonha
O Rei Carlos vai de sabre e de cetro
vai de zás e de perpétuo
rei de fim de linha
um rei entre camilas sociais
e comendazinhas
A monarquia já não é o que era
Os plebeus querem acreditar no brilho
de antes
mas
este
rei
já vai destronado
com o seu chapéu bobo, sem glamour
com os seus familiares bobos
da corte
Com a sua consorte
alimentar mais páginas da história da aristocracia
possível, estupidamente esvaziada e anacronicamente europeia
com Brexit sem Brexit, num queira ou não queira
O rei vai
mas já não vai rei.
E as suas moedas terão o cunho de fim de linha
A monarquia já só é bonita aos olhos dos pobres
familiares dos monarcas
que podem ver os seus sucedâneos
pela internet, pelo ecrã e
imaginar seus degredos
jocosamente entre paredes de
um castelo de ameias real
na ilusão de vestes,
na ilusão de poder
na ilusão, recorte, visão
de um tempo que se coroa
sem reis sem reais
sem pompas circunstanciais.
quem sabe, este não seja
o último dos comensais
que possa ver a careca dos dentes
dos seus súbditos e ainda nas ameias do castelo
guardar
a verdade
o segredo
da monarquia destituída;
Reinado nenhum se segura
pelo rei
mas pelo polvo de minudências
pelas princesas e dependências
pelas safiras e aparências
O rei vai aos bocados
mas não é rei de poderes
e sim da penicilina baforenta
cheio de idiotias reais
e não faz a coroação por menos
encomendou um eclipse em escorpião
para tal.
Dir-se ia que este último monarca
talvez seja dado em sacrifício
pelo rei que mata elefantes e lhes rouba o marfim
sumptuoso das vestes da monarquia mo mundo
cujo nome anda na baila
por ser um homem
igual aos outros
que tem filhos bastardos
e é dado aos escândalos.
E por tantos outros monarcas que nada acrescentaram
de nobre à nobreza de Ideais
Rei nenhum cura a magreza dos
que pagam vícios e subtileza
e grandeza
e ilusões de histórias reais
onde eventualmente, numa
coroação antiga, quiçá digna
os sapos se convertam na grandeza
de outros tempos ou no esquecimento
de toda a monarquia.
O rei
vai
triste
e monarca
E ainda assim,
os plebeus
bradam aos céus,
da sua tristeza
chamam triste à sua vileza
clamam algum tempo de antena
num mundo que não admite mais
monarquias.
O rei vai, então, monarca, mas doente
inseguro, mas crente
que depois destes três dias de coroação
ninguém mais lhe peça contas
ou orçamentos magros para
os seus gestos de alteza capital
O rei já vai
tarde
para
a
coroação.
E a pontualidade britânica
será escoltada pela sua guarda real
no Big Ben real
no minuto final
o rei despe a fantasia
e o povo olha os três dias como um dia
de ilusão colossal
depois disso, mais nada
servirá de desculpa
para os sortilégios vigentes
os seus filhos dementes
e o seu objetivo cumprido.
-Que não esperem rejubilo deste rei
que já vai mais plebeu
que o chapéu do pobre que um dia
o quis seu.
Nos tempos velhos de monarquia.
Essa senhora idosa
irá se retirar
dengosa e empurrada
pelo interstício
da política externa e internacional.
Arrumem-se as joias da coroa
e o baluarte
a monarquia adoece como todos os sistemas
privilegiados um dia
O rei vai, pois então que vá,
a coroa, essa fica no museu de história antiga
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