Shakira


La tortura

Os dias são todos iguais. No mundo. E eu continuo a sonhar contigo. Só nos meus sonhos, não há dor! E agarro-me a eles, a estes sonhos bonitos e puros, pois contêm o melhor de ti e de mim. Não sei esquecer-te. Nem quero. Nunca quis. Essa é a verdade, não vou abdicar do melhor dos meus sonhos! Se, pelo menos, me respondesses, me procurasses, me enviasses uma mensagem, me gritasses o teu desprezo, teria que guardar em mim tudo, de novo! 
Os meus ancestrais dizem que és meu, e Deus me diz que assim é! Por merecimento! Eu mereço o teu amor, mereço-te! E tu foges, para outro planeta, onde eu não estou, onde está outra qualquer, a empregada do café, a outra maquiavélica, gente má e oca, vazia e que em nada te acrescentam! Não vês tu que eu sou o amor da tua vida?
Até o tempo se dói comigo, por mim, o sol se esconde e a lua, ah, a lua cresce e minga, acompanhando o desaguar das minhas lágrimas e a estrela brilha intermitente, ora se revelando, ora escondendo. 
 Não há ser humano que me conheça como tu!
Avalio as peças do meu puzzle e entendo, hoje, porque tudo aconteceu desta forma. 
Depois de te perder, ainda fui atrás da banda, ainda assisti a espetáculos, junto dos técnicos de som e luzes, eles escondiam-me do palco e eu não entendia, na altura, na verdade, eu queria entender. Por isso, voltei a ver-te, tu no teclado, tu usando as roupas que desenhei para ti, ela usando as minhas roupas desenhadas para o palco, o Ivo, o Brito, o nosso primo Alcino, no seu acordeão, o Isaac, na sua bateria, onde o nosso filho tantas vezes fez o sound check, o Paulo, no seu baixo, faltava eu, eu que não queria palco, eu que fugia das luzes e te acompanhava com os olhos! Até confirmar que não passava de um fantasma que teimava em não aceitar aquele desfecho. E sei que foi provocado por outros, mas com a nossa permissão. Nós abrimos a porta à maldade, à intromissão de pseudo-amigos, nós acreditamos que os outros eram nossos amigos, nós! 
Volto ao escritório, com a lembrança, e lá, em cima da minha secretária, estão os posters recém-chegados da banda, com a vossa foto a que eu não assisti e estremeço, vendo o lenço dela na tua mão. Pormenor de somenos importância e, no entanto, ela foi a última prova de que alguma coisa estava mal. Ela premeditou tudo! Com o seu egoísmo! E saio do passado que me atormentou tantos anos mas que justifica o caminho seguinte. Como ousei não lutar por ti? Entregar de bandeja a nossa vida, como se fosse uma vida comum, a nossa vida, de acordo com o que ela queria! Sou "obrigada" pelo meu coração a renunciar desse passado, dessas imagens, sob pena de continuar a progredir a dor em mim! Chega de fantasmas do passado. Eu quero o presente, o hoje mas quero o futuro contigo, quero-te nos meus dias, sonho-te a toda a hora e vejo o teu sorriso e é ele que me guia para o futuro que virá, ao virar da esquina, ao virar do julgamento, ao virar das dores! E é aí que me sacio, nesse acontecimento que se dá dentro de mim! 
Logo após o julgamento vou à terra do mestre Saint Germain e depois dou um salto a Perpignan, abraçar a minha "Almerinda", de quem tenho muitas saudades e nela, encontro a todos, o teu pai, a tua mãe, a Ana, a Rosa, o Delfim, o António, a Dina, todos. Nela todos se reúnem, à espera de te verem também a ti. Esta família é minha, muito minha, sempre minha. Ganhei-a no céu, quanto te encontrei aqui. O David, a Xana, a Anita, o Miguel, a doce Ana, o Tonito, a Dulcita, a Dominique, todos habitam o meu universo, vivos e mortos no mesmo sonho! 
E quando te foste, não abdiquei deles, continuei a visitá-los, a estar com eles, sobretudo a Lina e a Almerinda, e continuei a ir a Moimenta, ao Cabeço de Castelo, espreitando a janela da Almerinda, na procura do seu rosto. Na casa da Rosa, num desespero de fim, esse fim que eu não aceitava! E tudo é passado e preciso desapegar dele, porque é doloroso, mas não os personagens, esses guardo para sempre. E ainda acalento o sonho de voltar lá contigo! De entrar na cozinha onde os potes de três pernos e o louceiro da Almerinda me inspiram nutrição e cuidado e amor e tanta saudade! Sou uma romântica incurável, uma triste é o que sou!
Ninguém vive de lembranças, eu sim. E guardo tudo, limpo as lágrimas gordas e quentes que teimam em toldar-me a visão do futuro e salto da cama, companheira de tanta dor e sorrio ao dia, sorrio aos pássaros e às flores e digo a mim mesma que um dia, a dor vai acabar, porque te vou ver novamente, ou por outro lado, porque vou desistir de estar cá, entrando num processo de autodestruição. O amor é que me move, só ele e esse amor é teu, está contigo, vai contigo para todo o lado! Tu és o meu amor! Por ti, esqueço a reciprocidade, só por ti! Meu amor, tem um dia bom, uma vida boa! Beijo-te os lábios e deixo-te entregue ao mundo dos outros! 

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