Alma Novaes

 




Abril num poema de nação


Somos âncoras do passado

carcomidas pelos lismos

disto e daquilo constados

na ciência do vazio

e se atentarmos, ainda ouviremos

falar dos templários e dos avós deles

que ao pisarem esta terra

marcaram a ferro e fogo

uma história transversal

de uma vida de guerra

para que o homem nasça novo

e falam em abril como se 

abril fosse uma janela de vaidade

que se pudesse

abrir, a qualquer altura 

num regime vestido de desfaçatez

de ausência de conhecimento 

e de facilidade

e não uma sentinela, um oráculo

que permeia o viço dos nossos ideais

dos calaboiços da pide 

ao exílio para se sobreviver

dos ideais destituídos

e que é deles, digam lá?

Salgueiro Maia se vivo, 

se arrepiaria da frivolidade

com que tratais abril

Deles, da utopia, dos demais

elos que nos ligam à história 

dos nossos ancestrais que de

mangas arregaçadas povoavam 

campos e cidades, agitando-se 

por fora, o grito que levavam

por dentro,

para onde fossem, 

para as rádios e jornais,

para o leito e só no peito

se fazem homens desse jeito

que se não calam às injustiças

que mais flexíveis que a cortiça

lutavam pelos demais?

E querem abril poema

abril vingando no podre sistema

da inquisição

não, abril recusa entrar e morrer

nessa gangrena

da falta que vos faz sonhar,

abril não é um poema, sem foice 

e sem justiça, e se assim é

abril vos fica na glote

como demora da vossa consciência

é preciso parir abril, 

mais do que abrir janelas

como se fossem poemas

que caem das árvores,

que abril é mais do que parece

é um sonho que estremece

nos que partiram, mas que teimam ainda

em fazer de abril mais que um mês, 

mais que uma revolução romântica,

uma equidade transparente,

que sejam rubros os cravos

mas não sejam de plástico

que tragam eles perfume

mas não se vomitem veleidades

Façam parir abril como uma nação

que se encontrou de novo

num homem novo

calibrado nos verticais ideais 

da fraternidade

da igualdade e da liberdade e, 

só então,

se legitime abril

rebentando diques, barragens, 

sem tiques de malandragem, 

de vileza e de hipocrisia

que abril se renovará, 

não como âncora

de ontem, mas como um 

princípio de alegria,

não uma vã fantasia travestida 

de interesses

abril rasgará vestes e mentiras e 

se desnudará em mil cravos

na primavera da nação



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