A UTOPIA ESSENCIAL É DO EU SUPERIOR




 

Nos Andes, como em todo o mundo, a lucidez precisa ser preservada e aumentada, juntamente com o discernimento. A paciência é fundamental, porque a humanidade evolui aos poucos.

 

Quinhentos anos não é muito tempo. Uma grande vantagem e prova de que a sabedoria andina vive hoje é o fato de que a visão histórica do povo andino é sempre uma visão de longo prazo, como destaca Alberto Flores Galindo em seu livro “Procurando um Inca: Identidade e “Utopia”. nos Andes”. Os cinco séculos que se passaram desde a chegada de Pizarro são apenas uma primeira etapa da relação entre os Andes e a cultura ocidental.

 

O resgate da cultura pré-hispânica começou no século XIX e o processo continuará. O sadomasoquismo já foi superado. Esgotadas a ilusão militarista e as ilusões políticas baseadas no ódio e no ressentimento, a descoberta da sabedoria eterna emerge e ganha força aos poucos.

 

A verdadeira fonte psicológica e espiritual das utopias humanas é o Devachan, o estágio harmonioso e “paraíso” que ocorre no estágio mais elevado do processo entre duas encarnações. [1]

 

O ideal de unir plenamente o céu e a terra é fundamentalmente uma necessidade da alma e, secundariamente, um ideal social.

 

A utopia essencial pertence ao eu superior, ou seja, ocorre na alma. Portanto, a utopia social, a ideia de “conseguir o céu na Terra” – para ser eficiente – terá que se basear no acesso prático de cada pessoa ao território do seu altruísmo individual. Tudo depende do acesso dos indivíduos aos seus próprios reinos celestiais. Trata-se de alcançar o espaço superior da alma humana, que se rege pela ideia da ação solidária, e cuja base é a amizade humilde com todos os seres.

 

Em relação aos impasses sociais, mencionamos acima a ideia do Terceiro Semestre. Vejamos agora algumas das palavras exatas do poeta espanhol Antonio Machado sobre o assunto. Depois de dizer que “metade do nosso coração permanece na pequena pátria”, isto é, na nossa comunidade mais imediata, Machado afirma: “mas a outra metade não pode contentar-se em limites tão estreitos”; Com ela invadimos, diz ele, todo o nosso país.

 

E conclui:

 

“E se tivéssemos uma terceira metade, nós a consagraríamos inteiramente ao amor de toda a humanidade.” [2]

 

A terceira metade, então, não é apenas a vitória espiritual sobre o ressentimento e as divisões cegas da alma. É também o princípio da fraternidade universal e da unidade de todas as coisas, que está na própria essência da sabedoria andina.

 

Passadas as primeiras décadas do século XXI, a agenda dos estudantes de filosofia esotérica deve incluir a tarefa de expandir a ponte consciente entre a tradição andina e a teosofia clássica e moderna.

 

Essa ponte ou “Antahkarana” supera todo o ódio e transmuta o sofrimento em sabedoria divina. Como resultado, produz uma paz interior que no momento certo purificará o social, o econômico, o cultural e o da alma.

 

(Carlos Cardoso Aveline)

NOTAS:

[1] Veja o artigo “ O Processo entre Duas Vidas ”. (CCA)

 

[2] “Rumo ao Terceiro Tempo”, Hugo Neira, SIDEA, Lima, Peru, segunda edição, 1997, 754 páginas, ver página 15. (CCA)

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