Bora, construir um mundo novo?

 



Se tinha que encontrar um outro caminho, havia que esquecer os caminhos anteriores. Os enganos anteriores. Os pensamentos anteriores. Havia que esquecer. Precisava de vento, forte o suficiente, para desarrumar tudo, retirar os lugares anteriores. A receita era simples, os ingredientes entendíveis, críveis, mas o vento era necessário porque o vento sempre tira tudo do lugar habitual, desarruma as folhas e as fragilidades, tonifica o agora. E se não podemos viver com um pé no passado e outro no presente, da mesma forma, não o podemos fazer com o pé no presente e outro no futuro. Nada disso. Precisamos dos dois pés no presente que é, no fim das contas, tudo o que existe. A adrenalina é do presente, o acreditar tem que ser fresco, porque se for uma crença antiga, vai conduzir-te ao antigo e, por lapso, cais outra vez no caminho anterior. A energia tem que ter um prazo alargado, aliás, todo tu tens que te segurar nos prazos confortáveis e alargados de um presente em constante mutação. Sem pressão. Tu não és um balão. Segura a esperança, olha-a, sente-a, cheira-a. Se for esperança tem que ter um cheiro de primavera, um toque de destreza e coragem. Precisamos de coragem, porque é ela que faz brotar no útero mental o que desenhamos no frio da nossa hibernação. Rasgar o velho, desconstruir o antigo é, antes de mais, arriscar o presente para destituir o que foi. Já era, já passou, já de mangas arregaçadas, já de utensílios prontos e o estado febril de fazer tudo do princípio. Também o verbo. Também o sonho. Também tu, todo novo, sem o velho chapéu, sem os velhos sapatos, sem o arcaboiço de culpas e de desculpas que já prescreveram. Empurras-te para um café fresco, para um dia fresco, para atitudes renovadas. Para um dia limpo. Organiza-te. Pega no papel, desenha o amanhecer e cheira-o. E agora escreve-te, prioriza-te. Começa a fazê-lo na folha lisa do papel. Desenha um dia novo, inteiramente novo, inteiramente teu, és o cabeçalho da lista, a parangona, o estertor, a musa e o poeta, és abril e caminhos novos. És um jardim de cravos e papoilas encarnadas. És suor e renovação. Empurra-te para a frente. E se surgirem rumores contrários, vozes da contradição, não as oiças ou diz-lhes não. O poeta resiste e diz não. E quando deres conta, já projetaste coordenadas e hemisférios noutros caminhos que ontem nem sabias existirem. E quando tudo for novo e nada for mais igual, vais olhar para trás, só para te injetares de energia, para continuares com mais vontade a romper um novo Abril. E esse Abril e essa tua vontade, depois de te mudar a ti, vai mudar o mundo. Começa pelo teu. E os anjos vão estar ali contigo. 


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