Montserrat Caballe & Alma Novaes

 


 

A um Velho

Mete o piano no poema e
arranca-lhe mis
e sois e ré e fás sustenidos
e deixa-o gemer contigo.
Açoita-o.

Deixa-o chorar as rugas,
os amuos

os retratos de saudade,
a tesão
e virilidade, amigo,
a vaidade dos poetas.

Vá, castiga-o, volta-o
de costas pra parede
retira-lhe qualquer pingo
de natureza viva,
qualquer verde. E se
preciso for, renega-o,
pisa-o, desconstrói a
dor do tempo e de
qualquer arrependimento.
Retira
silicones e botox,
o verniz e a sombra.
Despe-o em público e
dá-lhe bordoadas.
E mesmo que ao
espelho te embarace
pelos seus cabelos brancos
pela prótese,
nunca lhe chames velho,
nem dele troces.

Terá sempre um lamiré,
um si bemol pra te dar
nos momentos mais obscuros
(o ego a gozar com a tua cara).

Porque tempo de que
é feita a carcaça, continua
a ser a melhor benção
invenção do homem
pra separar os feitos e
transformá-los em feitios. 

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