As três opções ou wishlist

 





Queria ter ido à beira-rio. Na verdade, saí determinada para ir ao rio e depois ao hiper. O dia esteve seco e claro, se podemos comparar com o restante da semana. 

Apetecia-me, bem, tu sabes. Mas tu não queres constar da lista. Na segunda opção, era olhar o rio, enquanto através da música que por lá se ouve, fazer uma viagem astral. Costumo conseguir. Mas de tanto costume, a tendência nos últimos tempos, é encontrar demasiados motoqueiros (não consigo habituar-me a eles, ao ruído que fazem por onde passam), assim resolvi tomar café na esplanada do hiper. Pedi uma queijadinha de leite, para acompanhar o solitário. E fui fazer fumo até ao exterior. Um solitário tinha nas mãos o que me pareceu ser um jornal. Fiquei comovida. Ainda há desses que leem jornais. Depois constatei que era a bola. Ou seja, ui, há muitos desses. Fumei rapidamente, senti o frio a chegar com o sol a pôr-se, antes de entrar e depositar o tabuleiro no sítio do costume. E comecei a reparar nas pessoas de dentro. Dos balcões. Estão diferentes. Deve ser o efeito de Marte e o Sol em escorpião. Na verdade, mudanças radicais. Eu também as sinto, por debaixo da pele, no corpo todo, uma espécie de fluídos a tomar conta de mim, uma azia que vai e volta, a porra da sinusite mais forte, a atacar-me as mucosas, a dor de cabeça que parece ter ido, mas volta a estar presente, a dor de corno que parece não me abandonar, mas as pessoas estão mais bonitas, mais sensuais, mais abertas ao novo. Gosto disso. Tirei do bolso da sweater a lista de minudências pela qual me queria reger. Pão de alho e cacete francês, passei a queijaria e os salames e deparei-me com a peixaria sem fila. Uma postinha de salmão (ai que caro!) e duas douradas pequenas. Segui para a carnificina. Um pouco de vitela para picado que o Tomás e a minha mãe querem uma lasagna mas esqueci-me dos espinafres. Quatro bifes pequenos de frango, um pouco de carne desta e daquela para o mini cozido da Eva, couve-galega népia, só couve branca e só metade, o talhante chamou-me: olhe que deixou aqui as coisas no balcão. Pois, depositei o número 63 e esqueci-me de apanhar as compras. Segui para o leite, manteiga líquida e iced tea limocas. Fui aos vinhos. Trouxe a Mula Velha que é preferência da senhora minha mãe e para mim trouxe sumo de pêra. Deixei de comer carne, porém continuo a driblar com o peixe. É uma questão de tempo. Fui aos detergentes, faltava-me o da máquina de lavar roupa e a lixivia. E encontrei a bendita balança a 16 euros e trocó passo. Não hesitei. Há duas semanas, sem querer, a Eva colocou-se em cima dela e partiu-a, pelo mau jeito de se desequilibrar. Ela está a pesar 47 quilos e eu quase 56. Boa cena. Já recuperei o que era meu. Benditos biscoitos lagartos. Fui buscar gel de banho e esqueci-me das toalhitas. 

Quando saí para fora, estava completamente escuro, o parque completamente apinhado e o nevoeiro sebastiano fez-me sentir vesga outra vez. Lá meti das grosserias na parte de trás do carro, cinto de segurança e ala moleiro que se faz tarde. Não fui ao rio, não fui ao coiso, não arrisquei um milímetro do tempo ou do espaço que me queria permitir. Há sempre mais dias. A clausura nem me fica nada mal. Quase três anos de clausura, ena, quase monástica. Pra ser mais feliz, faltavas-me tu ou então, o Nepal, ou então um valente charro. Mas isso é pedir o impossível, deste lado do continente. 

A minha lista é pequena. Na verdade, só queria mesmo tudo. Tudo é um item. Mas o cimeiro és tu. Não hás no hiper. Só no meu coração, cravado, tatuado e nos meus sentidos todos. Alerta. Estás a conduzir. Se conduzires, não penses nele. Concentra-te porque o co-piloto está de férias. 

Voltei à maison e, depois de dispor tudo direitinho, ainda pus uma máquina de lençóis a lavar, ainda dobrei e guardei roupa que tinha no estendal na cozinha, junto da salamandra e ainda fiz uma aletria para a minha mãe que já me andava a pedir. Leite creme ou aletria. Foi aletria. Provei, mas a Eva já marchou com dois pratos dizendo que eu estava a ficar uma grande cozinheira, que até podíamos abrir uma filha pródiga ou assim. Sorri-me pela ironia. 

- Querida Eva, pra esse peditório, já dei tudo. Quase 15 mil euros investidos de uma forma obrigada. Numa cozinha, népia, nem a tirar cafezinho. Os meus dons são outros. quanto ao jantar, disse ela, estufado não me apetece. Quando for para a cama, como um iogurte ou um copo de leite com bolachas e fico composta. Não discuti. Ela continua a maratonar nas sopas de letras, intercaladas com as notícias da tv que eu altamente desaconselho. Mas uma mãe é uma mãe e ela é que escolhe o que quer trazer com ela. Já ouvi dois trabalhos musicais fantásticos, e já me deitava para dormir, agora dado o alarme no meu telemovel das 23.24, mas a Eva ainda vai na décima primeira hora e lá terei que esperar para dar a medicação e me deitar ao comprido, quando sua excelência resolver dispensar a tv e preferir a cama.

Enquanto isso, leio isto e oiço aquilo e tento dispersar a minha atenção ou volta a ti, sim, a tiTenho saudades tuas






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