Pavlov Dog & S. Martinho
Dormir cedo ou não dormir.
Chove e faz frio. A casa lamenta-se e geme, os galhos colam-se à estrutura robusta. Sem outra via que não seja a do embate. Gelo que imortaliza a erva daninha e vento que grita Inverno numa viscosa agonia de amanhecer. Os animais dormem na casa de madeira, já sem porta, gasta pela serventia de anos, a guardar artefactos e artifícios, cadeiras e mesas de um Verão quente., que gostaríamos de ressuscitar. Tempus fugit.
Imagino a minha cidade, a esta hora já cheia de trânsito, buzinas e pedidos de tolerância, autocarros cheios de pessoas com olhos esbugalhados, de remelas,
caras sem goma nem viço.
Correm,
pessoas de ténis e short
gabardine e
guarda-chuvas ou umbrellas
em poças de água,
contra tabuletas,
sem aviso, amanheceram,
envelheceram
indo
pró serviço,
contramão, sem noção
e nem uma lista de páginas amarelas
para consultar, pelos seus dedos
e o telefone toca
-Qual é a frase, a música, o pedido?
E o cliente distraído,
clica no comando da máquina de tabaco e nada
- Olhe que hoje é sexta-feira,
esqueça a torrada e a geleia
e traga-me só café.
A música invade
ocupa, entoa, ressoa e suaviza
o humor! Que horror, se agora isto
virasse os estates
instala-se um ambiente de sala
de aeroporto,
o iogurte na mesa ao lado,
o bagaço no balcão, o jornal
ah, sempre o jornal com as notícias de
séculos atrás continua a sujar-se
entre as mãos alheias e
o senhor da lambreta sai, eu não conheço
mas sei que existe e visto-lhe o kispo
do avesso e é de avesso em avesso
de estremeces ao estremeço que não
ferro o galho, não me deito
e nem durmo e nem adormeço
e talvez
possa pedir, já agora, um novo cimbalino
e mais uma vez me fecho, me fecho no eclaire
com talher que o empregado trouxe,
- e o que é que a menina disse?
- que me vou curar, vou deixar de frequentar
pastelarias e esplanadas, cidades guettos
deixar de viver vidas passadas, e sem mais
queixumes, vou-me atirar ao sono.
Primeiro, quero a musiquinha se faz favor.
E quando o dia for alto, tu continuas a produzir
eu em sobressalto, no asfalto-cobertor
tu, a trabalhar o stress e o vazio
de um futuro oculto, quiça sem amor,
já bem entroncado, já com o teu café tomado
falas com a empregada, namorada.
com isso, esqueces a torrada
e eu
vou estar abastecida de nicotina
de cafeína, de gasóleo aditivado,
de te ver com a menina ao lado
de dor de alma em alma,
assim é o coração e tu não vês?
(Agora, vê a minha sorte,
que estou pior que o chapéu de um pobre
Até o Abrunhosa rumina
qual vai ser a minha prosa,
a minha pena, a minha sina
e diz aos estrangeiros que
- Se for ao Porto, saia de fininho
da cidade e meta-se na A4
Vá pra Norte., vá ao Sapo)
Cansado de me ver chover,
lá me avia o pedido
do late november para o agora
enquanto me apronto, ele
chama a menina de azul e
já no meu quarto
abro as cortinas, sem medo,
do dia
de insónia eu entro na cama
fumo o cigarro enquanto oiço a banda
a trazer-me embalo às minhas feridas
E na cidade, se arranjam os preparos
para o S. Martinho com castanhas
que não são de Sernancelhe mas
a vida continua, life goes on, so they say
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