Alma Novaes
Hekate * Neptunus
A mente fervilhou,
literalmente,
toda a santa noite.
Neptuno dialogava
e ofertava-me,
sob o jugo da criatividade,
abundante, profícua
expansão e claridade
que me permitia antever,
incrédula,
a minha fusão
noutro patamar,
os véus rasgados
da nossa ignorância.
Sempre que me aproximo dele,
sempre,
vá zangada ou maldisposta,
ou sedenta de soluções,
e de resposta
às minhas infindáveis
questões,
ele recebe-me
atento e solicito,
abraça-me e beija-me,
dando sumiço
à minha física ansiedade.
Eis como Deus trabalha.
A infância é o estado
em bruto da nossa criança,
da pureza e da voluntariedade
com que nos atrevemos
nós a ser.
E é tudo o que viemos aqui fazer,
nos experimentarmos
deuses crianças,
autênticos, sem subterfúgios,
entre infernos
e os seus consequentes
malabarismos,
e o céu dos nossos sonhos.
A simplicidade é o patamar,
a escada, a ferramenta,
o doce fermento
do encontro com ele.
E este ele que
faz do encontro uma festa,
me chama pintatelas,
o diminutivo de chata,
num encontro sempre
disponível e afável,
e acrescenta que sou teimosa,
que essa é
a minha pior qualidade
e que para lhe agradar,
só necessito retirar o excesso,
a quantidade dessa qualidade
e serei perfeita,
na minha imperfeição humana
E eu entendo-o e trabalho
em mim para o progresso,
no qual pintarei uma rosa
como assinatura desta era digital.
E antes de sair de ao pé dele,
acrescenta-me baixinho,
antes de dar-me um beijinho,
pinta-telas, grafita e imprime,
cria, recria e exprime
o amor que sentes por mim,
que nesta fusão de nós,
estás inteira sem reservas
e que não há outra maneira
de me terem acesso.
Só o amor autêntico e sem reserva
leva ao encontro supremo
comigo, em mim, e que mesmo
que te fechem a porta,
desenha janelas.
Pinta o amor nas telas.
Usa aguarelas
e não te esqueças dos lagartos,
das borboletas,
não esqueças das flores
e dos pássaros,
reinventa uma forma
de pescares almas.
E eu obediente
deixo pendente a teimosia
e, antes de abandonar
a janela de deus,
vejo-te a ti
amor de outras vidas
invadires a minha casa
trazes, ao invés de rosas
dois pacotes plásticos
transparentes, nas mãos
um de sonhos e outro
de ovos moles
longe do que idealizei
e muito mais
do que me atrevi sonhar
trazes o sorriso no olhar
o teu coração de joelhos
beijas-me os olhos,
doce fascínio,
paixão sem cura e nem derivas
e no céu azul desenho
um lenço feito de nuvem,
e vejo-me adormecer
tu na sala, eu em ti
e uma vela se acende na eternidade
e então tu te revelas
te confessas
te expandes
Meu amor, tu és o sol
marte e alegria
o expoente do amor,
vertigem e fantasia,
e ia colher o beijo
neste amanhecer quando,
do sonho fui ao pesadelo
que me impede de
te concretizar,
ah então foi um sonho
e voltei a dormir e
tentei capturar-te ainda
dos olhos cansados de tanto olhar
e te não ver, me nascem
temores, quando acordada,
por aquilo que virá
e terá de ser.
Sacrifico-me em angústia
pelo que será,
e em homenagem,
requiem de coragem,
deixo uma rosa amarela.
E como me entrego
em tudo o que sou
decidi confessar-te
onde andei esta noite,
Só não te digo quem te trouxe
Mas tu sabes.
Vénus estava lá,
em tudo o que disse ou fiz,
eu,
a tua imperatriz criança
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